Liberdade em excesso é falta de limites


Doutora em psicologia, Jaíde Regra defende maior participação e cobrança dos pais em relação aos filhos, mas sem violência.



Nos tempos em que 46% das crianças e adolescentes possuem celular, a internet tira cada vez mais jovens do convívio real e a falta de tempo dos pais serve de argumento para se ''fazer as vontades'' dos filhos, é possível controlar o comportamento dos pequenos? Para a professora Jaíde Regra, doutora em psicologia pela USP, quando eles seguem ordens e regras, ainda que estejam com diferentes ''cuidadores'', a resposta é positiva. Confira suas principais declarações.
 
Como os profissionais da educação e pais devem agir diante de crianças que mentem e têm o costume de matar aulas?

Levando-se em conta que a mentira mais frequente é aquela que tem a função de evitar uma punição ou desaprovação, a forma de combatê-la é bloqueá-la. Esse bloqueio das mentiras só acontece através da checagem. Ao mesmo tempo em que se mostra que, uma vez mentindo, determinada criança perdeu temporariamente a confiança nela depositada, pais e professores precisam ajudá-la a recuperar essa relação. Toda vez que houver a checagem, o relato verbal da criança deve coincidir com os fatos ocorridos.

E qual a ação recomendada com aquelas que apresentam comportamento anti-social?

Comportamentos anti-sociais devem ser interrompidos pelo adulto nas situações de emergência ou de risco. Nas situações de maior gravidade, a criança precisa ser acompanhada por um terapeuta. De qualquer forma, pais e professores podem auxiliar no processo, analisando a criança sob alguns aspectos importantes, desenvolvendo a percepção do outro, isto é, como imagina que o outro se sentiu; identificando a consequência que o seu comportamento tem obre si mesmo; e, ainda, suscitando a pergunta: se a situação ocorresse normalmente, qual a alternativa para mudar a consequência desagradável para uma agradável?

Analisando as décadas passadas e os dias atuais, estamos com crianças mais ou menos ''difíceis''?

As crianças de hoje podem ser mais difíceis de lidar quando um conjunto de fatores estão presentes: cada vez há um maior número de pais que trabalham fora e as crianças são submetidas a sistemas de criação diferentes dependendo do ''cuidador'' do momento. Ora é a mãe e o pai, ora pode ser a avó, ora a babá. Cada um usando formas diferentes de lidar com cada situação. Isto dificulta a delimitação de limites, pois aquele que ceder mais, se transforma no mais querido.

Liberdade em excesso concedida em casa ou na escola se converte em empecilho?

Sem dúvidas. A liberdade em excesso é a falta de limites. Nesse sentido, em que converter ''não'' em ''sim'' torna-se rotineiro, a criança terá dificuldades de acatar as regras da escola. Todos perdem com esta situação.

Recente pesquisa mostrou que em Khartoum, Sudão, crianças submetidas à punição apresentaram mais problemas de comportamento que as demais crianças. Bater é a solução, por parte dos pais?
Não. A punição física gera raiva do punidor e não é educativa. Além de trazer sofrimento, faz com que a criança aprenda a mentir e a não assumir a consequência de seu comportamento.

E o educador, como pode ''fidelizar'' seu aluno?

Os alunos costumam descrever os professores legais como aqueles que respeitam o aluno, que são engraçados, permitem brincadeiras com respeito e são firmes com a falta de limites sem serem grosseiros. Planejam suas aulas para torná-las interessantes e elogiam os acertos e comportamentos adequados dos alunos, fazem perguntas para quem está prestando atenção. Dispõem as informações com aumento gradual da complexidade, favorecendo a compreensão, e criam dispositivos chamativos, como audiovisuais, que favorecem a concentração.

Punição física faz com que a criança aprenda a mentir e a não assumir a conseqüência de seu comportamento, diz psicóloga

Fonte: Bonde
Thiago Nassif - Folha de Londrina

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